O post de hoje é uma entrevista da sessão “Quem faz a Psicologia do Esporte”.
Conversei com Juliane Fechio, que atua no Santos F.C.
Blog – Comente sobre a sua trajetória acadêmica e profissional?
Juliane: Eu iniciei a minha trajetória na Educação Física. Fui atleta de natação e queria ser treinadora na modalidade e, por isso, optei pelo curso. Apesar de estar inicialmente envolvida com esta modalidade, sempre tive muita paixão por futebol. Durante a graduação conheci a Profa.Dra. Regina Brandão (uma das principais referências da área) que me apresentou a Psicologia do Esporte. Comecei a escrever alguns artigos envolvendo natação e Psicologia, todos em parceria com ela. Nesta época já tinha uma equipe de competição em natação e comecei a usar os conhecimentos adquiridos com a Regina Brandão nos meus atletas e cada vez me envolvia mais com a Psicologia. Logo após terminar o curso de Educação Física, fiz o curso de pós-graduação em Psicologia do Esporte que era coordenado por ela. Além do curso, fui convidada para fazer um estágio com a Regina Brandão no Centro de Pesquisas da FMU onde fiquei aproximadamente um ano e meio. Durante o curso e o estágio decidi que seria professora universitária de Psicologia do Esporte. Em 1999 iniciei meu curso de mestrado na PUC de São Paulo na área de Psicologia Comportamental e em 2002 já estava ministrando aulas em uma Universidade de Santos, cidade que escolhi para morar. Cada vez mais envolvida com as questões psicológicas, fosse com os meus atletas, com os meus alunos ou com os artigos que escrevia, decidi fazer a graduação de Psicologia, para que eu pudesse ser psicóloga do esporte e trabalhar com futebol. Ao contrário do que acontece com a maioria dos estudantes de Psicologia que entram na Universidade e durante o decorrer do curso decidem a linha teórica e a área que pretendem atuar, eu comecei o curso para poder atuar como psicóloga do esporte e já era totalmente apaixonada pelas ideias do Skinner e pelo behaviorismo radical. Logo que terminei o curso comecei a auxiliar um atleta profissional de adestramento (hipismo) e comecei a atender em consultório. Em 2010 fiquei sabendo que estava tendo um processo seletivo para psicólogo da equipe profissional do Santos Futebol Clube e enviei o meu currículo. No entanto, eles acabaram não fazendo nenhuma contratação para a área. Um ano depois foi aberta uma vaga para psicólogo das categorias de base do mesmo clube e me convidaram para um novo processo seletivo e neste fui contratada. Meu trabalho era com 280 atletas, de cinco categorias (sub-11, sub-13, sub-15, sub-17 e sub-20). Aproximadamente três meses após a minha contratação comecei a fazer alguns atendimentos pontuais na categoria profissional e em dezembro de 2011 o Muricy Ramalho me convidou para fazer parte da sua comissão técnica. Hoje fico em tempo integral com a categoria profissional e sou responsável também por supervisionar trabalho do psicólogo das categorias de base. Além disso, iniciei o meu doutorado na UNIFESP, um curso interdisciplinar em Ciências da Saúde, que conta com profissionais que atuam com esporte nas mais diversas áreas. Meu tema será a Excelência no esporte. Vou fazer uma análise das habilidades psicológicas e da trajetória profissional de jogadores de futebol de campo de elite. Minha orientadora é a Profa. Dra. Maria Stella Peccin e o meu co-orientador é o Prof. Dr. Ricardo Padovani.
Blog – Como a psicologia do esporte atua no Santos FC?
Juliane: Eu atuo junto aos jogadores do time principal (profissional), mas o trabalho começa na primeira categoria da base (sub-11). O nosso objetivo é fazer um trabalho preventivo e que aconteça durante toda temporada. Participamos do dia-a-dia dos jogadores (fazemos algumas refeições com eles, assistimos aos treinos, vamos aos jogos e frequentamos as concentrações). A intenção é desenvolver e trabalhar as capacidades e habilidades psicológicas dos atletas desde o momento em que eles chegam ao clube. Buscamos também, melhorar o bem-estar desses meninos e para isso atuamos junto aos pais e comissão técnica. As categorias de base ficam sob o cuidado do Shiro Kawauchi ( que também é psicólogo do esporte) sob a minha supervisão (semanalmente nos reunimos, discutimos e preparamos os conteúdos a serem trabalhados) e desenvolvemos as demandas de acordo com as necessidades de cada categoria (no sub-11 e 13 o trabalho é voltado mais para a formação e a partir do sub-15 mais competição basicamente). Quando os atletas chegam ao juniores já começamos a prepará-los para a transição na carreira. Como o Santos é um clube que aproveita muito os jogadores da base isso é muito importante para que eles sejam bem sucedidos quando chegarem ao futebol profissional. No profissional o trabalho preventivo é mantido e, também, intervenções são realizadas de acordo com a demanda da equipe e dos jogadores.
Blog – Junto aos atletas profissionais, especificamente, que tipo de intervenção você costuma realizar?
Juliane: As minhas intervenções são predominantemente individuais. São baseadas nas observações feitas nos treinamentos, nos jogos, na rotina do Centro de Treinamento, nas nossas conversas pelos corredores do CT e nas informações trazidas pela comissão técnica. Converso muito com os massagistas, com os profissionais da Santos TV (que fazem os bastidores dos jogos e das viagens), entre outros e vou colhendo informações importantes. Trabalho muito com o Aconselhamento (que é uma técnica rápida, objetiva e que acontece sempre onde o atleta está), normalmente isso é feito na saída do campo, no refeitório, na recepção do nosso hotel, entre outros. Quando o Aconselhamento não tem o efeito desejado, o atleta é chamado para a minha sala. Utilizo muito o reforço positivo, seja verbalmente ou por meio de fichas e folhas de registro (tem sido muito efetivo principalmente com atletas que estão com baixa autoconfiança), gosto de usar o estabelecimento de metas com os atletas que estão no departamento médico, realizo treinos para melhorar a concentração… Além disso, faço avaliações periódicas, tanto em grupo como individuais. Utilizo testes psicológicos e alguns questionários. Faço relatórios individuais com o resultado descrito em forma de texto e gráfico e entrego para cada atleta. Desses resultados eu faço a média do grupo (também com texto e gráfico), entrego e explico para o Gerente de Futebol e o Treinador. Resultados individuais somente o atleta tem acesso.
Blog – Como foi seu contato profissional com grandes estrelas do futebol brasileiro (Neymar, Ganso, entre outros) como é trabalhar com atletas desse nível?
Juliane: Tive a oportunidade de trabalhar com grandes atletas. É uma experiência muito boa, porque você consegue observar de perto a tal da excelência no esporte e poder contribuir de alguma forma com atletas considerados experts em suas modalidades é algo extremamente reforçador.
Blog – Quais são os pontos positivos e negativos de atuar num grande clube de futebol?
Juliane: Trabalhar em um grande clube de futebol traz muitas vantagens. Tenho uma boa estrutura de trabalho; é um salto importante na carreira profissional porque acaba abrindo portas, como por exemplo, atletas de diversas modalidades que querem ser atendidos por mim; o aprendizado é diário porque estamos diariamente com profissionais diferenciados, e há a oportunidade de trabalhar em todos os âmbitos, como por exemplo, a transição nas categorias de base para o profissional, a adaptação de atletas estrangeiros, a aposentadoria no esporte, entre outros. Por outro lado, a pressão é muito grande, principalmente aqui no profissional que trabalhamos diretamente com resultados; nosso trabalho precisa ser adaptado às necessidades do treinador, ou seja, se o treinador quiser apenas trabalhos individuais não podemos fazer trabalhos de grupo e, além disso, os atletas são pessoas públicas e, por essa razão, muitas vezes a imprensa acaba atrapalhando um pouco.
Blog – Houve algo marcante que possa compartilhar nesse tempo em que está atuando no Santos FC?
Juliane: Já vivi momentos muito marcantes desde que cheguei ao Santos Futebol Clube. Alguns momentos muito bons e outros muito difíceis. Mas vou dar como exemplo a nossa derrota por 8 a 0 para o Barcelona. Os jogadores viveram uma derrota histórica e ficaram muito abalados. Retornaram para o Brasil e se reapresentaram em uma segunda-feira para treinar com a torcida entrando no Centro de Treinamento para reclamar e pressionar e com um clássico contra o Corinthians marcado para quarta-feira. Nós não podíamos perder esse jogo porque isso traria muitos problemas, principalmente com a torcida. Aos 3 minutos do primeiro tempo o Corinthians fez um gol. Nossos jogadores tiveram muita resistência mental, suportaram a pressão e empataram o jogo. Saíram do campo de cabeça erguida e conseguiram usar a derrota como um aprendizado e como um estímulo para melhorar no Campeonato Brasileiro. Posso afirmar com muita segurança que a psicologia do esporte teve participação nesse processo.
Blog – Quais dicas daria a quem deseja ingressar na área da psicologia do esporte e especificamente atuar com o futebol?
Juliane: Desde que eu comecei a estudar sonhei estar onde estou. Uma vez fui dar palestra em um Congresso e um participante me fez exatamente essa pergunta e disse que para a maioria dos psicólogos entrar no futebol era algo que parecia muito distante. É uma vaga muito difícil de ser conquistada realmente, porque não são todos os clubes que contratam e, além disso, o futebol é um pouco conservador em relação ao nosso trabalho. Eu diria que é importante estudar muito o futebol, a psicologia geral e a psicologia do esporte. Desenvolver um projeto de trabalho, mas um projeto coerente, com respaldo teórico e não um projeto a ser apresentado como algo que vai resolver todos os problemas do clube, fora da realidade. O profissional precisa ser discreto e não pode ser deslumbrado.
Blog – Compartilhe conosco dicas de leitura, eventos, etc.
Juliane: Gostaria de divulgar o III Congresso Internacional de Futebol (3 a 5 de Setembro) em Porto Alegre. O Footecon 2014 – XI Fórum Internacional de Futebol (acontece sempre após o término do Campeonato Brasileiro, em Dezembro) no Rio de Janeiro.
Um livro que eu utilizo bastante: MARTIN, G. L. Consultoria em Psicologia do Esporte: orientações Práticas em Análise do Comportamento. Campinas: Instituto de Análise do Comportamento, 2001.
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Entrevista para o programa Redação Regional
Contato: juliane.fechio@santosfc.com.br
Abraços.
Até!!!
Muito bom
Olá Juliane estava procurando uma ajuda para o meu filho e acabei encontrando seu nome e gostei do que li…Tenho um filho chamado Luca Santos ele é atleta da FUPES ,corre os 100m.no atletismo,o Luca é um menino que tem 16 anos,disciplinado,focado em seus treinos e td mais…só que tem um problema,durante as competições ele vem sofrendo várias lesões,inclusive ganhou mais uma agora nessa última competição,aparentemente sem motivo,pois treina muito bem durante 4 hrs.por dia,não reclama de dores,tem uma boa alimentação e fico preocupada com a sequencia de lesões que ele vem sofrendo,como é um menino estremamente ansioso (acabamos de sair de um tratamento crônico de gastrite)gostaria de marcar uma consulta com vc,para podermos ver o que podemos fazer por ele…você atende em algum consultório,qt custa a sua consulta?obrigada desde já pela sua atenção…
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