Semanas atrás surgiu a noticia da prisão do jogador Breno, condenado a três anos e nove meses pela justiça alemã por ter incendiado sua própria casa, em Munique, em setembro de 2011.
Particularmente não vi e nem ouvi na mídia de modo geral uma discussão aprofundada sobre o tema, que penso ser de extrema importância. Não só por se tratar da prisão do atleta, mas sim do contexto do ocorrido, das suas consequências e até das possíveis prevenções, justamente para que esse episódio triste não se repita com outras pessoas, com outras jovens promessas de nosso esporte.
Breno Vinícius Rodrigues Borges, hoje com 22 anos, se destacou jogando no São Paulo em 2007 onde foi campeão brasileiro tendo sido eleito o melhor zagueiro da competição, foi vendido, aos 17 anos, por aproximadamente 12 milhões de Euros ao Bayern de Munique onde assinou contrato com validade até junho de 2012. Teve passagens pela seleção brasileira, integrou a equipe medalha de bronze nos Jogos Olímpicos de Pequim em 2008. O jogador não teve muito espaço no clube de Munique, e foi emprestado ao Nuremberg em 2010. Ao final da temporada atual, o contrato do zagueiro chegou ao fim e, desde então, ele ficou sem vínculo com nenhum clube.
Durante o período na Alemanha, Breno, sofreu: para adaptar-se a sua nova realidade, ao novo país, ao idioma e a cultura local. Além disso, teve seguidas lesões, fez algumas cirurgias, que não o deixaram se firmar no Bayern de Munique. Há relatos na mídia que Breno nos últimos meses sofria de alcoolismo, depressão, estava em processo de separação de sua esposa.
Sei que o assunto é extremamente delicado, antes de tentar aprofundar mais nessas questões, penso que todos nós somos responsáveis pelos nossos atos, independentemente da causa dos mesmos. Breno foi considerado pela justiça alemã, o responsável pelo incêndio em sua casa. Se a justiça alemã investigou e chegou a esse veredito, não podemos discordar, mas, podemos pensar talvez, no que levou essa pessoa a se comportar dessa maneira.
Faço abaixo algumas reflexões para que possamos tentar respondê-las ao longo do post: qual é a responsabilidade dos profissionais do staff do jogador? E do clube formador? Qual é a responsabilidade do Bayern de Munique? Estamos falando de mercadoria ou de pessoas? Esse acontecimento poderia ser evitado?
Com relação ao clube formador, sei que atualmente o São Paulo FC possui psicólogos do esporte (até porque conheço os colegas que estão lá e são profissionais sérios e experientes), porém quando o jovem Breno Borges começou sua trajetória, o clube, pelo que sei, não possuía em seus quadros de funcionários psicólogos para trabalhar nas categorias de base (se alguém souber essa informação, por favor, me corrija). Não estou querendo fazer desse post corporativismo barato, não da para afirmarmos com exatidão se mesmo com auxilio psicológico desde o inicio de sua carreira, isso poderia ser evitado. Se algum psicólogo ou profissional de saúde mental vender a ideia de que todos os comportamentos humanos podem ser “controlados ou prevenidos”, cuidado!!! Desconfie!!! Por mais “controle” ou tecnologia que tenhamos o ser humano, muitas vezes, ainda tem atitudes imprevisíveis e inexplicáveis. Porém, é fato!!! Profissionais de psicologia auxiliam no desenvolvimento humano, na prevenção e promoção da saúde. Isso não se discute!!! A Psicologia do Esporte nas categorias de base de qualquer modalidade esportiva é sim, imprescindível. Acredito que o trabalho na formação de atletas é dos mais importantes da nossa área. Não dá para falar de “formação”, de atletas ou de pessoas como muitas instituições esportivas propagam se não houver a psicologia integrada e consistente atuando junto as outras disciplinas nesses ambientes. Psicologia é ciência, chega de achar que é uma área menor e irrelevante, estamos no século 21.
Desde cedo, jovens promessas do futebol já possuem pelo menos um empresário, quando não, um grupo deles. Há pessoas nesse meio que não são sérias, só visam o lucro, portanto tem a visão de que os atletas são seus “objetos”. Existem também profissionais capacitados e que proporcionam o respaldo necessário aos seus clientes. Sabemos que o futebol é um negocio lucrativo, e justamente por isso, penso que empresários e clubes deveriam investir a longo prazo na formação intelectual e cultural dessas pessoas, independentemente se irão se tornar ou não atletas de ponta, deveriam ainda se responsabilizar e zelar por eles, por que a sua fonte de renda também é fruto do trabalho dessas pessoas. Cabe aos atletas também, ter uma postura mais ativa, afinal de contas é a sua vida e a sua carreira que estão em jogo. Seus interesses deveriam ser os prioritários, não ao contrário.
No caso de Breno, sabemos que ele é oriundo de uma família muito humilde, com poucos recursos, ele surgiu como uma “nova estrela” do futebol antes de completar 18 anos, ainda em processo de desenvolvimento físico e emocional. Na sua transferência deveria haver um período de adaptação para se ambientar num país tão distinto do nosso.
Às vezes, com os nossos “complexos de vira-latas”, tendemos a achar que tudo que é de fora é melhor, mais estruturado, mais belo, coisa e tal. O grandíssimo clube Bayern de Munique, como toda a sua história, pompa e estrutura deveria ter no minimo por obrigação algum tipo de assessoramento ou um departamento para cuidar exclusivamente da transição dos jovens que chegam de outros países, principalmente das Américas e da África, já que as diferenças culturais, sociais e econômicas são gigantescas. Investir nos atletas é cuidar do patrimônio do clube. Segundo informações veiculadas nos meios de comunicação, o Bayern disponibilizou um médico psiquiatra, Dr. Aachen Henning Sass, para cuidar de Breno nos últimos meses, quando os sintomas depressivos mais se acentuaram. A meu ver, faltou cuidado com essa transição na carreira, desde o inicio, por parte de todos os agentes envolvidos (clube formador, empresários do atleta e Bayern de Munique). O incêndio na casa de Breno foi o “estopim”, literalmente de todo esse processo.
Afinal, esse acontecimento poderia ser evitado? Talvez sim. A depressão é um transtorno psicológico que pode acometer qualquer individuo independente de sua classe social, religião, idade ou profissão. Segundo a Organização Mundial da Saúde atinge 15% da população mundial e só no Brasil afeta 36 milhões de pessoas. Em 2030 será a patologia que mais acometerá as pessoas e afastarão as mesmas de seu trabalho e até do convívio social. Esse distúrbio, não é “frescura”, não é “crise existencial”, como diz o senso comum, tem de ser tratado com seriedade, com o auxilio de psiquiatras e psicólogos. A depressão é silenciosa, ela não chega de uma hora para outra e passa, isso é tristeza, sentimento inerente e comum a todos os seres humanos. Na depressão ocorrem geralmente outros comportamentos que se instalam além do estado alterado de humor, é comum irritabilidade, falta de motivação, apatia, compulsões, entre outros elementos. Além disso, há fatores que fortemente influenciam nos quadros de depressão: aspectos biológicos e genéticos, psicológicos e emocionais, sociais e ambientais. Extinguir os distúrbios psicológicos ainda não é possível, talvez nunca venha a ser, mas volto a afirmar, eles podem ser minimizados e prevenidos, desde que haja profissionais e estrutura adequada para isso em clubes e instituições esportivas.
Emocionado durante o julgamento, Breno pediu perdão à família. “Eu peço desculpas por aquela noite. Peço desculpas, também, à minha família e aos meus filhos, para quem não fui um bom exemplo”.
Torço para ele se reabilitar, para que ele cumpra sua divida com a sociedade alemã e principalmente se reestruture, para que aí sim, possa se sentir exemplo aos seus filhos. Ele é jovem e tem uma vida inteira pela frente, pode seguir outros rumos e se tornar um cidadão pleno de suas ações. É possível superar os obstáculos que a vida nos apresenta, mesmo aqueles que aparentam ser intransponíveis.
Para finalizar, coloco essa citação de Mário Quintana, que sintetiza muito melhor que eu o que tentei dizer nesse monte de palavras nesse post …
“Somos donos de nossos atos, mas não donos de nossos sentimentos; somos culpados pelos que fazemos, mas não somos culpados pelo que sentimos; Podemos prometer atos mas não podemos prometer sentimentos … Atos são pássaros engaiolados, sentimentos são pássaros em vôo”
Abraços.
Até!!!